Nós e os Nossos Objectos

Quando falamos de fluxo de energia no espaço somos tentados a considerar apenas os espaços vazios da casa. Se a casa está mais cheia de móveis podemos considerar que a energia flui com mais dificuldade. Se há divisões atulhadas de tralha dizemos que a energia está bloqueada. Se temos tantas coisas atrás das portas que elas pouco abrem é claro que há constrangimentos no fluxo energético.

Se à primeira vista o fluxo de energia acontece apenas através dos espaços livres da casa, a realidade é que tudo é energia e todo o conteúdo da casa: estantes, livros, roupeiros, roupas, objectos decorativos, instrumentos de cozinha, loiças, tudo, mesmo tudo, colabora no fluxo energético.

A energia é o que conduz a nossa vida. É ela que nos alimenta, nos anima o corpo e a alma, nos mantém através do tempo no momento presente.

Para que a nossa vida progrida e nos mantenhamos saudáveis e vivos em todas as nossas dimensões é necessário que a energia que nos rodeia seja harmoniosa, fresca, clara e vibrante.

Se a energia flui no espaço, ela flui também em nós, ligando-nos a todos os sítios que já visitámos, a todas as pessoas que conhecemos, à nossa família, às casas em que vivemos e a todos os objectos que nos pertencem. Todas estas conexões representam trocas energéticas. Ao alimentarem-nos permitem-nos sentir de coração cheio e ao drenar-nos retiram-nos energia fazendo com que nos sintamos cansados e sem acção.

No que respeita os objectos que temos em casa há aqueles que nos trazem boas recordações e têm a capacidade de nos entusiasmar de nos transmitir energia positiva. Muitos porém têm associadas memórias menos boas, ou são relativos a tempos passados, a actividades que já não nos fazem sentido agora e ao decidirmos mantê-los connosco estamos a permitir que uma pequena parte da nossa energia seja usada nessa conexão, drenando-nos ou pelo menos ancorando a nossa energia no passado e portanto não a disponibilizando para o nosso presente.

Assim, quantos mais objectos tivermos mais dispersa estará a nossa energia. Quanto mais desorganizados estiverem os objectos mais confusos estaremos e sempre que permitirmos que acumulem pó, sinal de que não há movimento, mais estaremos a estagnar a energia à qual estamos ligados.

Um sinal que de há algo a fazer em casa é a sensação de bloqueio, de que queremos avançar e de que nada acontece. Como se não tivéssemos capacidade para agir. Sempre que isso acontece é sinal de que a nossa energia está parada, está bloqueada, de que parte (grande parte) da nossa energia vital está ligada a objectos que provavelmente:

  • Já não têm utilidade para a nossa vida presente e para o que queremos fazer no futuro próximo.
  • Pertencem ao nosso passado e que por diversas razões se mantêm connosco
  • Estão desorganizados e eventualmente pouco limpos
  • Não gostamos deles ou não gostamos da pessoa de que nos ou da forma como nos foi dada.
  • Trazem-nos memórias menos positivas ou desgastantes.

Todos os objectos podem ser ‘lidos’ energeticamente por nós, pelo menos nalgumas das suas camadas. Podemos aceder à forma como o objecto nos faz sentir e através do nosso poder pessoal podemos optar por mantê-lo connosco ou libertá-lo.

Todos os objectos foram desenhados com algum propósito e desse ponto de vista todos os objectos podem ser ‘úteis’. Tudo serve para alguma coisa. Tudo já foi ou pode ser útil um dia. No entanto, manter muitos objectos que não são usados há anos porque ainda podem ser úteis no futuro significa que projectamos o futuro como equivalente ao passado, no qual as experiências e o tipo de vida se repete – só assim se justifica que o que já passou tenha espaço novamente no futuro – e portanto sem grande espaço para o novo, para uma nova forma de vida, com experiências novas e gratificantes. Também significa que não confiamos na vida, no sentido em que não acreditamos que o universo nos providenciará tudo o que precisarmos em qualquer momento. Este tipo de pensamento é mais frequente em pessoas que consideram que tudo o que têm, ou lhes acontece é resultado apenas do seu próprio esforço e trabalho, que não tendo uma visão mais ampla não confiam no processo da vida. A manutenção de objectos do passado serve-nos também como identidade. Se não estivermos sintonizados com o nosso eu, se não soubermos quem somos, a manutenção de objectos do passado ajuda-nos a contextualizar a nossa existência, a saber quem somos e onde pertencemos. É bom saber donde viemos o que nos trouxe até aqui mas isso não é o mesmo que acharmos que ainda somos o nosso passado. É bom ter coisas do passado o problema surge quando tudo, ou a maior parte, é do passado, está desactualizado. Se ficamos presos no passado podemos ficar em stand by, num estado em que já não somos o que está pra trás mas em que não nos conseguimos tornar verdadeiramente naquilo que potencialmente já somos.

O excesso de passado tem também uma função clara: bloquear o futuro. Podemos querer isto inconscientemente. Se não nos permitimos a fragilidade de não saber o que o futuro nos trás, se a nossa necessidade de controlo é grande então bloquear o futuro pode ser uma forma de estabilidade, de garantia de sobrevivência.

Muitos dos objectos que temos podem ser difíceis de libertar. Quantas vezes já arrumámos aquela gaveta ou aquele armário e decidimos manter a quase totalidade do seu conteúdo. Fiamos com aquele objecto que alguém nos

deu há 10 anos e que na realidade não nos interessa muito porque pensamos que seria uma desfeita, um menosprezo para aquela pessoa. 

Pense que quando foi oferecido foi apenas com a intenção de lhe agradar a si e que se libertar o objecto não vai estar a ferir de forma alguma o seu amigo ou familiar. Se pensa que vai haver alguma cobrança por parte da pessoa se não vir o objecto em sua casa já estamos a falar de relações de poder. Autoriza que essa pessoa domine a sua vida e se sobreponha ao seu poder pessoal?

Tudo o que está inacabado ocupa também a nossa energia. Por exemplo aquele trabalho manual que não acabámos e guardámos prometendo lá voltar fica a ocupar um canal da nossa energia. Todas as intenções relacionadas com a casa e que estão começadas ou apenas pendentes desgastam também a nossa energia. São exemplos o azulejo que já se partiu e que precisa de ser substituído, a porta que queremos pintar mas para a qual ainda não temos a tinta, o armário que queremos arrumar e que vamos adiando. Todas estas coisas necessitam de energia para serem feitas mas também necessitam de energia para se manterem por fazer, pelo que é possível manter a situação indefinidamente se não houver nada que atalhe o processo. Muitas vezes, são os nossos processos internos que estão bloqueados e que não permitem o desenrolar dos processos físicos. Se assim fôr é útil fazer uma análise do Bagua e verificar a zona da casa correspondente e tentar tomar consciência do problema. Esse é um momento de libertação energética e que permite como que a dissolução do problema e a rápida resolução em termos físicos.

No sentido exposto acima, demasiadas intenções lançadas para a casa, sem o realismo de encontrar formas de concretização, prazos e prioridades podem ser contraproducentes, no sentido em que geramos ligações energéticas a partir de nós em múltiplas direcções, que no limite só servem para nos drenar energia e impedir que tenhamos energia para as fazer. Por outro lado quantos mais objectos tivermos mais energia necessitamos para os manter. E essa energia pode ter muitas formas, para nomear duas: esforço físico e dinheiro. Precisamos de ter espaço para os guardar: uma casa maior é mais cara do que uma mais pequena. Precisamos de os limpar e organizar: ou o fazemos ou pagamos a alguém para o fazer por nós. E o tempo, esforço e dinheiro que despendemos a comprar coisas novas. Será que precisamos mesmo delas? O que poderíamos fazer em alternativa com esse tempo e com esse dinheiro?

Ter menos coisas ajuda-nos a focarmos-nos no essencial, naquilo que é a nossa realidade presente e no que queremos para o futuro mais próximo. Ter menos coisas ajuda-nos a ter mais energia para a vida, a usufruir mais do momento presente, a experienciá-lo com mais liberdade e satisfação.

O processo de simplificar a casa, de libertar o que já não nos serve, pode demorar algumas semanas ou meses mas os resultados vão surgindo ao longo do caminho. Por ser um processo intenso tem que ser feito com algum método e sentido de compromisso, caso contrário perde-se pelo caminho. As solicitações da vida actual são imensas e há o risco de se perder o rumo rapidamente.

Como metodologia pode ser seguida a seguinte:

  • Ordenar as divisões da casa de acordo com a prioridade. Escolha intuitivamente a prioridade. Pode ter uma divisão mais cheia, com mais coisas do passado, mais bloqueada, mais suja. Em caso de dúvida, escolha em primeiro lugar as suas roupas e depois o seu quarto na sua globalidade.
  • Para cada divisão faça uma lista ordenada de todas as gavetas, prateleiras, móveis que vai abordar. Se não tem muito tempo e tem que conciliar este processo com a sua vida diária planeie gastar entre meia a uma hora de cada vez. Evite também desarrumar muitas coisas de uma só vez. Quando se sentir com mais energia e tiver tempo disponível pode disponibilizar mais tempo. Mas lembre-se que se se cansar muito pode ficar sem vontade de retomar o processo. São preferíveis pequenos passos que o façam chegar longe.
  • Em cada unidade de mobília (prateleira, gaveta) passe por todos os objectos um a um perguntando-se se gosta deles, se lhe foram úteis no último ano, se tem boas recordações associadas.
  • Não aceite manter objectos por culpa, por medo, por não querer magoar outras pessoas. Lembre-se que os objectos são seus e como tal não pode ficar refém deles. É livre para decidir. Lembre-se que a memória de que esses objectos existiram e o fizeram feliz durante algum tempo será suficiente, não precisa de os manter fisicamente consigo para sempre, se eles já não se enquadram no seu presente.
  • Repita o processo se depois de rever uma gaveta ou prateleira decidir manter tudo. Em cada momento há sempre coisas para libertar.
  • Faça questão de limpar bem as coisas que guardar.
  • Atribua um lugar para cada categoria de objectos, ou seja guarde as luvas todas no mesmo sítio e encontre um lugar para guardar a cola e os blocos de apontamentos de forma a ir directo ao local sempre que precisar deles.
  • Pense no que fazer aos objectos que libertou na fase seguinte. A decisão é sobre manter o objecto ou não. Evite ficar com objectos só por não saber como lhes dar uma nova vida. Ao decidir que não os quer os Universo pode apresentar-lhe maneiras fáceis de os encaminhar para outros sítios.
  • Em termos de soluções há várias (sem ordem predefinida):
  • Perguntar aos seus familiares ou amigos se os querem
  • Doar a uma instituição (por exemplo a bibliotecas, no caso dos livros)
  • Colocar num local de passagem para que alguém que venha a passar os leve
  • Vender – apenas se o valor do objecto o justificar!
  • Deitar fora
  • Libertar, através de uma cerimónia (que pode ser prévia a qualquer um dos pontos anteriores), agradecendo o período em que o objecto esteve consigo.

Todas as pessoas podem beneficiar de uma selecção, limpeza e organização dos seus haveres, aquilo que em geral é referido como ‘destralhar’. Na prática, todos aqueles que se sentem bloqueados e sem energia para conseguir avançar serão os que mais facilmente irão usufruir dos resultados.

Manter a casa limpa, organizada, a par com o seu eu actual e na qual o seu poder pessoal esta espelhado, é uma prenda permanente para si próprio e para a sua vida.

Teresa Borges de Sousa Publicado no nº11 da revista “vento e água – feng shui lifestyle” de 1 de Fevereiro de 2019